Todo Amor do Mundo Cabe em 8gb é um conto de ficção científica disfarçado de romance, ambientado em Manaus futurista (pero no mucho) e publicado semanalmente aqui, no Mapingua Nerd / Imagem:1041uuu


Os usuários do d-hand nunca reclamaram  – pelo menos, não frequentemente – das versões definitivas que foram vendidas ao longo dos anos, desde o lançamento do aparelho.
Segundo os servidores de Estatísticas de Reclamações Inconvenientes e Infundadas, em sua maioria, elas eram quase todas nulas (ou apagadas).
O que não muda o fato (a bem da verdade) de que sempre se questionou o motivo deles existirem apenas em versões de 8GB.
Uma vez que os antigos e rudimentares pendrives possuíam um limite bem maior que o do novo modelo, era de senso comum que ele – pelo menos nos primórdios de seu lançamento – não iria satisfazer os clientes já acostumados com os drives de bolso que possuíam até então capacidade mínima de 500GB de memória.

Ledo engano.

Um pendrive não era um d-hand.
Um pendrive não se conecta ao corpo e liga o cérebro à Grande Rede Social-Neural (GRESON)
E as pessoas ainda nem haviam descoberto suas singularidades.
E quando descobriram…
Bem, quando descobriram vocês já sabem, pelo o que viram até aqui.

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Há quem diga que a ideia do limite de memória no d-hand foi de um dos desenvolvedores do protótipo inicial.
O desenvolvedor alegou que se a USB.live passasse a vender outros d-hand’s com memória superior a 8GB as chances de pessoas entupirem as unidades com um repertório sorteado de aplicáveis que elas com certeza não iriam utilizar mais de uma vez em sua memória aumentaria descomunalmente, exigindo então uma grande verificação constante de atualização de todos esses aplicáveis inutilizados, algo que demandava muito tempo, suor e paciência, para os desenvolvedores da USB.live.
Não que isso fosse ruim para a empresa (seria ótimo finaceiramente, sendo franco), mas eles tinham que fingir que se importavam com a memória e segurança mental do cliente e com a quantidade de coisas que eles enfiavam na cabeça sem enlouquecer.
“Tudo bem que no fim, as pessoas vão encher suas mentes com lixo de qualquer jeito mesmo, mas, que seja pelo menos um lixo bem selecionado – Como disse o possível desenvolvedor – É melhor criar burros úteis pra si mesmos do que inúteis para todo o resto.” – Completou ele, sem se tocar que era um burro útil para todo o resto.
Foi então que o sistema plug-in-hand passou a ser vendido com um aviso onde letras bem grandes e garrafais na embalagem era a primeira coisa que um eventual comprador poderia distinguir:

“CUIDADO. APENAS 8GB. SELECIONE BEM OS APLICÁVEIS QUE IRÁ DESFRUTAR. NÃO APAGAMOS POSTERIORMENTE”

Curiosamente, essas informações acabariam também sendo o principal fator que ajudou alavancar as vendas do d-hand no início de sua assimilação pelo público.

Primeiro, com o “quê” exatamente se deveria ter cuidado? Com um simples e risível drive de 8gb?
Ora, por favor. Processadores de informação neural eram bem mais perigosos que isso. – Pelo menos era o que muitos alegavam. Foi aí que os primeiros sintomas de um aparente fracasso começaram a aparecer….

Um belo dia, a senhora Georgina Miller, 78 anos, enviou a seguinte carta manual escrita com a prótese esquerda (pois era canhota) para a USB.live:

“Caros programadores da USB.live. Em primeiro lugar, gostaria de parabeniza-los pelo excelente produto que vocês lançaram. Devo dizer-lhes que já me diverti deveras com as suas aplicações tutorias de bordado, culinária e pilates. Estou satisfeita com o serviço de vocês, exceto pelo fato de que o seu tradutor não funciona muito bem. Recentemente me mudei para um novo asilo onde posso desfrutar de boa companhia, lazer e segurança. Acontece que ninguém fala minha língua e isso está começando a se tornar irritante. Peço-lhes encarecidamente que verifiquem o seu atual sistema de tradução simultânea, para que esses enfermeiros entendam de uma vez por todas que na minha xícara de café nunca se coloca mais de 4 gotas de adoçante. Muito obrigada pela atenção. Tenham um bom dia. “

Georgina Miller

O principal problema (porque afinal, eram muitos) para a USB.live, era que não existia esse tal de“sistema de tradução simultânea” do qual seus usuários idosos reclamavam. O que a USB.live teve que enfrentar não só no caso desta senhora, mas de muitos outros também portadores de Alzheimer, era que, de alguma maneira, eles sempre conseguiam esquecer sua língua padrão, tornando-se fluentes logo seguida em alguma outra língua como alemão ou síndarim. Os neuroprogramadores buscavam uma razão para que isso acontecesse e embora estivesse claro que a doença neuro-degenerativa e a má interpretação do manual do d-hand eram as principais razões, era muito mais óbvio que portadores de Alzheimer não deveriam ter um d-hand.