Tá difícil, né? Eu sei. Com a pandemia e a péssima gestão do governo federal, a vida do brasileiro se tornou mais precária em muitos sentidos. Em tempos sombrios como esse, o que te dá vontade de continuar? Para muitos, os quadrinhos oferecem uma oportunidade de inspirar, fugir ou de tranquilizar. Vamos bater um papo sobre isso?

Há uma relação entre o isolamento social e a incidência de depressão em determinadas comunidades. Segundo a professora Marilisa Barros, que apresentou um estudo no evento “Depressão, saúde mental e pandemia“, 40% dos brasileiros sentiram tristeza ou depressão desde que o período de isolamento começou, em 2020. Ainda segundo o estudo, houve aumento no consumo de cigarros, bebidas alcoólicas e comidas processadas, além de mais tempo gasto nas redes sociais, menos exercício e poucas horas de sono.

Este quadro não é novo e seu agravamento se repete em determinadas comunidades por conta de eventos similares, em alguns casos sem que possamos compreender completamente sua ocorrência. Claro, o isolamento provocado pela pandemia foi, e continua sendo, necessário, apesar disso.

Mas o que isso tem a ver com os quadrinhos? Bom, como falei no início, muitos encontram na arte o pedaço que sentem faltar em suas vidas. Essa discussão sobre a “função da arte” é longa e não entrarei nela agora, mas a questão é que os quadrinhos exercem, muitas vezes, o papel de ocupar certos espaços. Motivam, inspiram, confortam, divertem, informam. Estamos falando de uma mídia que, infelizmente, não é acessível a todos. Mas não importa se você lê as tiras do jornal, os encardenados de capa dura ou se aventura nos webtoons gratuitos. O importante é a sua relação com o material.

Em seu site, o ilustrador e professor de desenho, Daniel Brandão, afirma “os quadrinhos me salvaram”. Em um depoimento emocionado, ele conta que “[…] enquanto, muitas vezes, o mundo real se mostrou vazio, depressivo, sinistro e perturbador, encontrei nos quadrinhos um portal de entrada para um universo paralelo perfeito e encantador“. Para Daniel as HQs foram tão essenciais que hoje a arte se tornou seu caminho profissional, de onde ele tira o próprio sustento.

Por Daniel Brandão

Os quadrinhos também salvaram Lourenço Mutarelli. Em entrevista ao site Universo HQ, Mutarelli, um dos autores mais consagrados da área no Brasil, relata a relação de sua produção em quadrinhos com a luta contra a psicose maníaco-depressiva (ou síndrome do pânico): “Os quadrinhos salvaram minha vida! Eu tinha dificuldade de me relacionar, de me expressar. O quadrinho fez com que eu me relacionasse, me casasse, com que eu tivesse um filho. O quadrinho foi fundamental!“.

Calma, não estou sugerindo que quem tem problemas emocionais deve apostar nos quadrinhos como uma cura. Nada pode substituir o acompanhamento de um profissional. A arte não deve ser utilizada como mero escapismo para quem está doente ou sofrendo de um desequilíbrio momentâneo, mas pode sim surgir como um complemento para um tratamento ou como fonte de motivação para seguir em frente, como já foi citado.

Pessoalmente, se os quadrinhos ou a música não existissem, seria muito mais difícil sair todo dia para trabalhar e viver numa rotina estressante. A arte funciona, para mim, não apenas como ferramenta de alívio das pressões sociais, mas também como uma forma de conhecer mundos e diferentes perspectivas sobre esses mundos.

A narrativa simples e divertida de Dragon Ball, a sensibilidade de Miyazaki em Nausicaa, as discussões políticas e sociais de Alan Moore, as marcas de uma época em Tartarugas Ninja e a beleza inconfundível do traço de Moebius, são só alguns exemplos do que mais me encanta na nona arte. Os quadrinhos, a exemplo de Mutarelli e Daniel, me salvam, dia sim, dia também.

Por isso, se cuide e siga em frente para continuar, como eu, conhecendo personagens cativantes, histórias emocionantes e ideias transformadoras. Há muitos quadrinhos por aí, apenas esperando que você os encontre.

Até o próximo papo!