Nesta semana vamos falar sobre uma das tropes mais comuns no que se refere a personagens LGBT: a bury your gays (enterrem seus gays, em tradução livre). Mas antes…

O que é uma trope?

Diversos dicionários, como o Oxford e o site Word Reference, definem trope como uma figura de linguagem, chamado de “tropo” na língua portuguesa. Mas o Urban Dictionary e o Merriam-Webster já usam a definição mais comum quando se fala de ficção: algo que já foi usado tantas vezes em enredos e tramas que ficou batido. É uma frase ou expressão usada para se referir a um tipo de personagem, a uma estrutura narrativa, a um tipo de enredo. Tropes por si só não são uma coisa ruim, mas muitas vezes elas acabam virando clichês. 

Alguns exemplos são a Estupidez Vilanesca, em que o vilão tem o herói encurralado, mas por algum motivo não consegue derrotá-lo; a Cá Entre Nós, em que o vilão faz um monólogo explicando seu plano ao herói; e a É só um pirralho, em que o herói encontra vários outros personagens que presumem que ele é incapaz por ser (ou parecer) muito novo.

Bury Your Gays

Então, inicialmente o nome era Dead Lesbian Syndrome, ou Síndrome da lésbica morta, porque existia um número absurdo de mulheres lésbicas e bissexuais sendo mortas em filmes. Mas com o tempo o termo cresceu para englobar também os personagens masculinos.

A personagem Silhouette, da equipe Minutemen original, já começa Watchmen morta.

O que aconteceu foi que nas décadas de 60 e 70 ser gay não era algo bem visto pela sociedade (e 50 anos depois a gente pode até dizer que tá melhor, mas nem tanto), e os produtores e as editoras pediam que fossem escritos fins mais trágicos para os personagens LGBT.

Por causa disso, personagens homossexuais nunca tinham um final feliz: em um relacionamento homossexual pelo menos uma das partes era morta (geralmente a mais bem resolvida quanto a sua sexualidade e que “levava a outra para o mal caminho”), personagens vistos como “depravados” sempre morriam e os poucos que não eram mortos nunca tinham a possibilidade de serem felizes. Isso tudo para mostrar que a homossexualidade não levava a nada de bom e que era algo “perverso” e, portanto, não tinha lugar nos finais felizes.

O site TV Tropes (que lista todas as tropes possíveis e imagináveis de todos os gêneros) diz que “o problema não é que os personagens gays são mortos, é que só eles são mortos numa história cheia de personagens hétero ou são mortos simplesmente por serem gays”.

Atualmente

Apesar de incidência dessa trope ser bem menor quando todos os personagens principais (ou a maioria, pelo menos) da história são gays, alguns filmes e séries tiveram finais felizes, como Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, 4th Man Out e a terceira temporada de Skam. Mas ainda existem casos em que a trope acontece, em The 100 (uma das personagens lésbicas foi acidentalmente morta por um tiro), Clube de Compras Dallas e Atômica.

Isso não é pra dizer que personagens LGBT sempre tem que ficar vivos e só os héteros têm que morrer, mas há outras histórias a serem contadas sobre nós. A gente entende que às vezes, principalmente se for um filme de guerra ou filme dos 70 e 80, os personagens gays morrem. Pessoas LGBT que viveram nessa época foram mortas simplesmente por não serem hétero ou cis (e isso acontece até hoje). Mas outros não só sobreviveram como foram felizes.

A minha impressão, pessoalmente, é que a porcentagem de personagens LGBT mortos diminuiu (pouco, mas diminuiu), mas eles escaparam disso só pra continuar a história e ainda assim não ter um final feliz.

E é algo tão comum que nós já sabemos como o filme vai acabar mesmo antes de vê-lo (tô olhando pra ti mesmo, Call Me By Your Name, por mais que eu tenha gostado). Tomar a tragédia como único caminho possível para a história não dá mais.