Há poucos anos, a gente costumava ouvir um discurso muito comum entre os jovens manauaras de que não tinha nada de interessante para fazer na cidade. Estive nessa era (inclusive falei muito também) e vivi para vê-la sumir: SEMPRE tem o que fazer.  E uma das experiências mais interessantes de fevereiro/março com toda certeza é a exposição coletiva que está rolando na Galeria do Largo São Sebastião, que reúne o trabalho de mais de vinte artistas independentes em um único espaço!

Realizada pela Secretaria do Estado do Amazonas com curadoria de Turenko Beça, a mostra coletiva traz quatro exposições com propostas diversas, mostrando o quanto a arte visual local pode ser eclética. A estratégia de reunir os artistas para melhor aproveitamento de um dos espaços públicos mais atraentes de nossa capital deu absurdamente certo, e a abertura da mostra rendeu à Galeria do Largo um dos eventos mais agitados dos últimos anos.

Logo no térreo, o visitante tem a possibilidade de prestigiar o espaço Almas da Cidade, que reúne o trabalho sensível do fotógrafo Darlan Guedes em uma instalação que nos apresenta uma Manaus a qual muitas vezes não costumamos dar atenção, além de prestar homenagem ao poeta Luiz Bacellar em um documentário exibido no local.

Em seguida, podemos experimentar um deleite visual completo no espaço Crio 19, que como o nome sugere, nos apresenta a visão única de 19 artistas independentes da capital, com abordagens tão diversificadas que servem de perfeito exemplo sobre os tipos de artistas que estão se formando na cidade. Daniel Hebron, por exemplo, apresenta uma narrativa visual no melhor estilo RPG, ao misturar texto, ilustração e quadrinho para narrar sua Gaia Vindicta. Alexandre Mourão também chama atenção ao combinar fotografia e tratamento digital para expor seu olhar único sobre o ambiente urbano. Luiz Caetano opta por reimaginar personagens de nosso folclore através da arte digital, enquanto Bruna Mazzoti trata do erotismo de maneira delicada e apaixonante. Teti Belém expõe uma visão de si mesma que por vezes me remeteu ao trabalho de Frida Kahlo e Nathalia Silveira faz verdadeiras poesias visuais ao usar café em sua técnica de pintura. Paulo Mendes Auá vai mais longe ao fisicamente incorporar suas personagens andróginas que apresentam espantosos traços alienígenas e indígenas, nos fazendo esquecer dos limites de gênero e raça que nos impomos todos os dias, e olha que nem estou descrevendo todos os trabalhos incríveis da Crio.

Ao subir as escadas, damos de cara com Sozinho, trabalho de Stanley Rodrigues que fala da solidão de maneira bastante peculiar ao retratá-la em um personagem que suponho ser inspirado pelo Pinóquio, tanto visualmente quanto pelo conceito de perceber-se sozinho. Ao lado, o espaço Bicho Urbano traz as cores vibrantes da grafiteira Chermie Ferreira, e contou com performance da drag amazônica Uýra no momento da abertura. Uýra também destaca-se modelo para o espaço, imortalizada nas cores de Ferreira em um dos principais retratos do trabalho da grafiteira.

Imersão é a palavra que, pelo menos para mim, definiu a experiência que o Centro de Artes Visuais Galeria do Largo oferece de 17/02 a 30/03, totalmente gratuita, de terça a domingo das 13h às 19h. Para quem não conhece, fica ao lado da antiga sorveteria Glacial, no Largo São Sebastião, Centro de Manaus.

Fotos por Eduardo Alves.